abril 19, 2009

Escolhas feitas

Próximo de completar 50 anos, sinto-me ranzinza, impaciente com tudo que envolve subcultura, futilidades que não estejam ligadas diretamente ao meu conforto e discursos repetitivos, cheios de lugares-comuns. Ler os jornais tornou-se, portanto, um exercício cada vez mais penoso. Depois do Google Reader, que me permite selecionar o que realmente me interessa, quase não há mais sentido em ler um jornal.

Aliás, o verbo é inadequado: não leio – dou uma passada de olhos. Mas até mesmo isso aborrece. Às vezes, o porteiro da manhã interfona, lembrando-me que os jornais estão na portaria há três ou quatro dias...

Do Estadão de hoje, por exemplo, o que se salva? O artigo de Demétrio Magnoli e o caderno de Economia. É verdade, leitor, você tem razão: minha ranzinzice alcançou níveis perigosos, próximos da intolerância. Mas, aos 50, não posso perder tempo com o que estou cansado de saber. Chegou a idade em que, calejado, sigo as dez ou quinze primeiras linhas de um texto – e sei o raciocínio do autor, conheço seus argumentos. Muitas vezes, nem isso é necessário, pois basta ver o nome do articulista para que eu vire a página rapidamente. Tenho certeza de que, em 99% das oportunidades, as pessoas repetirão o que vêm dizendo há anos – ou o que outros dizem há séculos.

Aos 50, não posso perder tempo com quem chove no molhado, com vacas de presépio, puxa-sacos, plagiadores, espíritos servis, demagogos, copiadores de releases, esquerdistas de todos os gêneros e, principalmente, com os que escrevem mal. Certa idéia pode ser extraordinária, mas se for escrita em português claudicante provoca no meu coração aquele prenúncio de angina pectoris que sinto quando, depois de admirar uma bela mulher, descubro que a concordância verbal não é um dos seus pontos fortes.

Minhas escolhas estão feitas. Eliminei do meu horizonte os temas que considero pequenos, insignificantes. Permaneço aberto ao novo, claro, mas desde que ele passe pelo crivo dos padrões de qualidade e de gosto pessoal que instituí para o meu universo. No âmbito da música, por exemplo, minha sensibilidade está fechada à maioria das manifestações contemporâneas. Sou atacado de profunda tristeza quando o Estadão passa uma semana sem publicar a crítica de Lauro Machado Coelho. E viverei os próximos dias, até quarta-feira, na expectativa de ouvir Falstaff com a Osesp.

Como vêem, além de relutar em seguir as novas regras de ortografia, tive a lucidez de não só abandonar a esquerda, mas tornar-me um conservador cético. Relendo as cartas de Jacob Burckhardt (a Editora Topbooks publicou uma ótima seleção há alguns anos), encontro a síntese do meu pensamento: "É uma longa história [...] a difusão da cultura e o decréscimo de sua originalidade e individualidade, da vontade e da capacidade; e um dia o mundo irá sufocar e cair sobre o estrume de seu próprio filisteísmo".

Apocalíptico demais? Não creio. Aliás, basta caminhar alguns quarteirões em São Paulo, dar uma espiada nos lançamentos das editoras ou ler um jornal: o futuro previsto por Burckhardt se tornou presente.

6 comentários:

Unknown disse...

oi Rodrigo, acredito essa selação é um bom sinal. Vc conhece o bllog do Idelber Avelar. Acho que vc iria gostar de dar umas passadas por lá , os cometários tb são ótimos, melhor que ler jornal.
http://www.idelberavelar.com/
Abs

Beatriz disse...

Espero que vc consiga ler pelo menos um verso do meu livro rsssssssss

J.L. disse...

Poxa, verei o Falstaff com a Osesp no domingo. Pena, não esbarraremos.

J.L. disse...

Verei o Falstaff no domingo. Aguardo seus comentários sobre o concerto.

digo disse...

Salve, Jonas! Escrevo algo assim que voltar da Sala São Paulo. Forte abraço!

Fabio Fernandes disse...

Rodrigo, não vi o Falstaff, infelizmente (ou felizmente, pelo seu último post), mas concordo com você. Vou completar 43 anos no próximo dia 16 e me encontro completamente decepcionado com o mercado editorial brasileiro, mesquinho, atrasado, decrépito. Estou parando de ler em português quase completamente - e não é nem uma questão de princípios. Simplesmente aconteceu: sinto-me mais próximo da língua de Joyce, Ballard, Burroughs que de Camões (não dispenso um Leminski ou um Valêncio Xavier, mas são as famosas exceções que confirmam a regra).

Também não tenho mais tempo a perder não, meu amigo. Vamos à luta, aprendendo a nos desviar dos moinhos de vento (só que, parafraseando tristemente aquele livro de auto-ajuda, tudo na vida são moinhos de vento...)

Abraço forte!!