outubro 30, 2013

O que é um gênio?

Boris Pasternak
A definição é de Isaiah Berlin, ao recordar, no ensaio “Conversas com Akhmatova e Pasternak”, de 1980, os encontros que mantivera com esses escritores em 1945 e 1956. Esse texto será o tema da aula de hoje no curso “A Descoberta do Ensaio”:
 
“[...] Ele falava formulando magníficos períodos em câmara lenta, com ocasionais torrentes intensas de palavras. Sua fala freqüentemente transbordava as margens da estrutura gramatical – passagens lúcidas eram seguidas por imagens loucas, mas sempre maravilhosamente vívidas e concretas –, e essas poderiam ser seguidas por palavras obscuras, quando era difícil acompanhá-lo – e então de repente ele voltava a entrar numa clareira. Seu discurso era sempre o de um poeta, assim como seus escritos. Alguém disse certa vez que há poetas que são poetas quando escrevem poesia e prosadores quando escrevem prosa; outros são poetas em tudo o que escrevem. Pasternak era um poeta de gênio em tudo que fazia e era. Quanto a sua conversa, nem me atrevo a descrever sua qualidade. Só conheci uma outra pessoa que falasse como ele: Virginia Woolf, que fazia a mente do interlocutor disparar assim como ele conseguia fazer, obliterando no ouvinte a visão normal da realidade do mesmo modo inebriante e, às vezes, estarrecedor.
 
Uso a palavra ‘gênio’ de caso pensado. Às vezes me perguntam o que quero dizer com esse termo impreciso, mas altamente evocativo. Em resposta, só posso afirmar o seguinte: perguntaram certa vez ao bailarino Nijinsk como ele conseguia saltar tão alto. Parece que ele teria respondido que não via grande problema nisso. A maioria das pessoas, quando pulava no ar, descia à terra imediatamente. ‘Por que descer imediatamente? Pode-se ficar um pouco no ar antes de retornar à terra, por que não?’, dizem ter sido a resposta. Um dos critérios para definir o gênio me parece ser precisamente isto: o poder de fazer algo perfeitamente simples e visível, que as pessoas comuns não conseguem realizar e sabem que não podem fazer – nem sabem como é realizado, nem por que não podem nem sequer imaginar como fazer. Pasternak às vezes falava em grandes saltos; seu emprego das palavras era o mais imaginativo que já encontrei; arrebatado e muito comovente. Há sem dúvida muitas variedades de gênio literário: Eliot, Joyce, Yeats, Auden, Russell (pela minha experiência) não falavam assim. [...]”

2 comentários:

Thiago Ramos - Cirurgião Dentista disse...

Notável e mais uma preciso alerta no tempo em que o envaidecimento intelectual não tem necessariamente um equivalente essencial verdadeiro.

Marcos Guerson Jr disse...

Caro professor,

Não pude assistir a aula de ontem, mas o farei assim que estiver disponível. Seus cursos tem sido uma dádiva para todos nós e um abrir as portas para uma cultura que apenas vislumbrávamos. Agradeço imensamente.

Tive uma experiência de abrir um clube de leitura em Brasília no ano passado e foi muito bom. Lemos um livro do Simenon, uma peça do Shakespeare, O Coração das Trevas e Orgulho e Preconceito. O objetivo maior foi despertar o gosto pela leitura em meus colegas e nisso foi um sucesso.

Este ano estou morando nos Estados Unidos, mas volto ao Brasil em janeiro. Pretendo repetir a experiência, agora no Rio de Janeiro.

Se algum dia o senhor puder passar algumas dicas e conselhos para esse tipo de atividade agradeço e talvez sirva de inspiração para seus alunos poderem fazer esforços semelhantes para contribuir em resgatar nossos amigos da miséria cultural que fomos condenados.

Um abraço.