novembro 03, 2014

O melhor caderno de anotações

Um dos instrumentos de escrita imprescindíveis, mesmo quando estamos cada vez mais acostumados a escrever em smartphones e tablets, continua sendo o velho caderno de anotações. Demorei anos até encontrar um que me agradasse completamente, o que aconteceu em 2005, quando ganhei de minha mulher o meu primeiro moleskine.

Não se trata de um caderno qualquer; seus tamanhos e modelos adéquam-se perfeitamente a diferentes atividades, do desenho à escrita, da música ao diário de viagem. São confeccionados de maneira a reunir praticidade, conforto e uma beleza sóbria, garantida, nos modelos clássicos, pela capa preta que envolve o papel livre de acidez.

Não bastassem essas características — além de outros detalhes, como o elástico que fecha o volume e o envelope colado na parte interna da contracapa —, o moleskine traz a tradição de ter sido usado, dentre outros, por Hemingway, Van Gogh e Breton.

O escritor Bruce Chatwin, mais conhecido por seus relatos de viagem, conta um pouco da sua experiência com esses cadernos em O Rastro dos Cantos: “Cada vez que ia a Paris, comprava uma nova leva numa papeterie da rue de l’Ancienne Comédie. As páginas eram quadriculadas, e a capa e a contracapa eram mantidas fechadas por meio de um elástico. Eu os tinha numerado em séries. Escrevia meu nome e endereço na folha de rosto, oferecendo uma recompensa a quem o achasse. Perder um passaporte era a menor das preocupações: perder um caderno de anotações era uma catástrofe”.

Mas a verdadeira catástrofe ainda estava por vir: “Alguns meses antes de minha partida para a Austrália, a proprietária de uma papeterie disse que o vrai moleskine estava cada vez mais difícil de achar. Havia um fornecedor: uma pequena empresa familiar em Tours. Demoravam muito a responder cartas. ‘Gostaria de encomendar cem’, eu disse à madame. ‘Cem vão durar uma vida.’ Ela prometeu que telefonaria para Tours sem delonga, naquela tarde. No almoço, tive uma experiência temperante. O maître da Brasserie Lipp não mais me reconhecia: Non, monsieur, il n’y a pas de place. Às cinco, honrei meu compromisso com madame. O fabricante havia morrido. Seus herdeiros tinham vendido o negócio. Ela tirou os óculos e, quase como se estivesse de luto, disse: Le vrai moleskine n’est plus.”

Falecido em 1989, Chatwin não pôde experimentar a alegria de ver o retorno do vrai moleskine, desta vez pelas mãos de uma empresa italiana, a Modo & Modo, que reiniciou a produção em 1998.

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